quarta-feira, 31 de agosto de 2016

Caminhos de Santiago 2016 - Rubiães a Mós

O despertador tocou as 5h, não queria acreditar que já estava na hora. Desapertei o saco cama mas deixei-me ficar ali na preguiça uns minutos, sentia-me demasiado exausto para continuar.
O arrumar das coisas demora sempre algum tempo e, sendo o único acordado, tentei fazer devagar e com o mínimo de barulho possível. Parece que quanto mais devagar se faz uma coisa, mais barulho ela fará.
O relógio marcava 5h30 quando comecei a andar. Ainda de noite e com segmentos sem qualquer tipo de iluminação a não ser a minha lanterna, os primeiros 4 quilómetros demoraram mais do que queria a serem feitos. Após isso e com apenas 45min de caminhada, parei um pouco para comer alguma coisa. Embora ainda fechado por ser muito cedo, parei no mesmo café onde, no ano passado, o meu pai decidiu que não conseguiria continuar devido as bolhas nos pés.
Quando recomecei a andar impus o ritmo elevado a que me habituei nos últimos dois dias, que me permite cobrir boa distância sem chegar demasiado tarde aos locais. Em apenas 1h já tinha entrado no concelho de Valença e 30min depois, com 17km realizados, já estava no forte, à saída de Valença, à saída de Portugal.
Faltava agora a primeira etapa que no ano passado realizei sem o meu pai, 23km até Mós. Começando por atravessar a ponte que liga Valença a Tui, para entrar oficialmente em Espanha e nos últimos 115km até Santiago.
À saída de Tui uma parte muito chata: mais de 4 quilómetros seguidos em estrada nacional. Embora permita andar a bom ritmo por ser plano o suficiente, a monotonia da estrada cansa muito mais que qualquer montanha. Além do cansaço psicológico, a estrada também já me estava a dar bastantes dores nas plantas dos pés, pelo que aproveitava sempre que a terra na beira da estrada era grande o suficiente para lá andar, sendo muito mais suave o impacto nos pés.
A estrada da lugar a montanha e, passado bastante tempo, cheguei a uma espécie de café, nas traseiras de uma casa, onde já tinha parado o ano passado. Desta vez estava vazio, para quem teria saído de Valença já era bastante tarde. No entanto, apanhei o primeiro grupo de portugueses do Caminho desde que comecei; eram 4 em que um tinha cometido o mesmo erro que eu na primeira vez, enquanto inexperiente: trazer a mochila demasiado carregada. 
A paragem foi curta, dando apenas para uma bebida fresca. Assim que continuei tinha em mente que, daí a pouco, chegaria ao local onde há uma pequena "guerra" entre comerciantes e a Associação do Caminho de Santiago da Galiza, em que uns querem mudar parte do Caminho para uma parte mais bonita pela floresta, e os outros insistem em fazer de tudo para que os peregrinos se mantenham no percurso antigo. No local onde se dá a alteração de percurso observa-se várias tentativas de quem defende o novo percurso a serem destruídas e substituídas por outras. Muitas manchas de tinta preta a tapar as setas amarelas "verdadeiras" e muitas outras setas, também amarelas, a tentar encaminhar para a zona industrial, onde os comerciantes acreditam que conseguirão vender se as pessoas por lá passarem.
A parte da floresta era exatamente como me lembrava: de uma beleza incrível e intocada a não ser o simples caminho que lá passa no meio. Uma pequena ponte de pedra para passar por cima do riacho e uma outra a acompanha-lo onde não há caminho.
Assim que saí deste percurso de floresta encontrei um casal a falar com uma pessoa de mota, eram uns alemães a quem um espanhol, membro da Associação, explicava o novo caminho, fora do complexo industrial. Este espanhol tinha já passado na zona perto de Porriño a renovar as setas amarelas e ia a caminho da primeira zona de "guerra" para também lá renovar. A estas pessoas tenho imenso a agradecer pelo seu esforço em manter o Caminho algo apreciável de se realizar.
Continuando o meu caminho, a sentir-me cada vez mais cansado e com os pés a ressentirem-se, fiz o esforço de chegar até Porriño. Lá, sentei-me 5min a descansar os pés, passei num supermercado a comprar cereais e barras de cereais e em pouco tempo segui caminho, faltavam apenas 6km para o Albergue e poder descansar a vontade, apenas 1h de caminhada.
Não demorou muito para ter a certeza de uma coisa: tinha uma bolha. Afinal sou mortal! Ontem fui sentindo uma coisa estranha no pé esquerdo, debaixo dos dois dedos mais pequeno, aquilo que parecia ser uma bola, ou a meia estivesse dobrada. Mas sempre que parava e mexia um pouco o pé a verificar, não parecia ter nada. Decidi não mexer, tentar ignorar a dor e continuar a andar, fazendo mais força com os braços de forma a aliviar ainda mais a pressão das pernas e utilizando os batons para me ajudar a andar ainda mais rápido, estava determinado a chegar ao albergue. Mesmo assim, estranhamente, apareceram-me dores nas pernas, estavam a começar a queixar-se da pancada que apanharam ao longo de 3 dias, mesmo com a quantidade de proteína que tenho comido, entre as barras e as latas de atum. Entre as pernas cansadas e a começarem a doer e a planta dos pés também dorida, só aliviava e distraia esta dor o sentir a bolha a crescer.
O reconhecimento do local do albergue foi uma grande alegria, só queria tirar a mochila e descansar. O tirar das sapatilhas confirmou o receio de ter uma bolha, no mindinho do pé esquerdo. Além disso, observando ao espelho, que também já tinha reparado ontem, tinha umas pequenas bolhas e micro espinhas nos ombros. A minha teoria é que o estar tanto tempo com a mochila nos ombros impediu a pele de respirar corretamente, provocando pequenas espinhas. Fora isso, sinto-me bem, para alguém que acabou de fazer 150km em 3 dias haha.

A etapa de hoje demorou mais de 7h a ser cumprida, percorrendo uma distância de mais de 42km. Mais de 50 mil passos e 4500 kcal foram necessários para isso.

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